segunda-feira, 2 de maio de 2011

SIMBOLOGIA DOS ELEMENTOS - SÉRIE 3

SOBRE TECIDOS DE ALGODÃO
Foto: Maira Lins


Verlaine - Algodão inglês. Roubei da minha sogra. Para você fazer roupas de baixo. Até camisas...

Quando pousamos nosso olhar, nossa atenção sobre este trecho, cabe perguntar o que pode significar este elemento: um corte de tecido, em um momento tão especial do texto, justamente quando os dois personagens estão se separando. Podemos considerar que vários outros presentes seriam mais interessantes: uma boa garrafa de vinho, Absinto, quem sabe até tintas, canetas e papéis. Então, por que um corte de tecido?

A princípio ele surge como uma recompensa. Algodão inglês não era tão valorizado quanto a seda, na França, mas prestava-se muito bem a um vestuário sem maiores sofisticações. Daí que poderia servir “até” para camisas. Melhor se fosse alvejado. Mas a primeira proposição era fazer “roupas de baixo”, já que Rimbaud declarou abertamente que veio sem elas. A sugestão era cobrir-se. Naquela época dizia-se: “cobrir as vergonhas”.

Mais adiante, no texto original, Alcides Nogueira sugere que Riubaud retire um longo pano branco de algodão de uma mala e dance com ele simulando a vela de um barco. Temos aí, novamente, a presença de um tecido, desta vez disponível para cobrir o corpo inteiro. Neste caso, combinado com o texto, capaz de enfunar-se e levá-lo para longe, mar à dentro.

Os dois elementos (o segundo não aparece na nossa montagem) apresentam-se com significações diametralmente opostas. O primeiro, trazido pelas mãos de Verlaine, propõe-se a esconder, a tirar da visão, a cercear os sentidos e o desejo. Já o que sai do “espaço vazio” de Rimbaud (a mala), apresenta-se como o elemento capaz de abrir espaços, levá-lo para longe, na direção do desconhecido.

Na sequencia em que aparecem no texto, percebo como representações do poder de expandir, de transformar concretudes em mistérios, qualidades que o poeta simbolista trouxe em sua bagagem aparentemente composta de vazios. E espaços vazios não são aqueles onde não existe nada. Muito pelo contrário, são aqueles onde tudo cabe.


HILDA NASCIMENTO - PREPARADORA DE ELENCO E DIRETORA ASSISTENTE

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