A GARRAFA – EMBRIAGUEZ E LUCIDEZ
Foto: Maira Lins |
Uma garrafa é um objeto criado para conter algo dentro. Supõe-se que um dia esteve vazia e foi cheia em algum outro momento, guardando um conteúdo para ser esvaziado depois... ou não. No caso de Pólvora e Poesia, vinho. A dois. Inúmeros objetos poderiam estar ali. Mas o que está é uma garrafa.
Uma garrafa de bom vinho dá-se ao luxo de ver passar o tempo em “caves” climatizadas, deitadas. Ali importa cuidar delicadamente do seu conteúdo que passou por um misterioso processo de transformação no qual tornou-se agre, pra depois alcançar a doçura, a sofisticação que leva ao aguçar do paladar. Podemos afirmar que o vinho conhece a trajetória entre a vida e a morte. E isto é confirmado, através do tempo, sempre associando esta bebida a cerimônias que celebram as estações da vida.
O vidro, por si só, é um sólido quase líquido. Seu estado é intermediário entre esses dois estados físicos, dada a organização peculiar de suas moléculas, mais distantes entre si e ligadas de uma maneira bagunçada. É uma matéria que transita entre sua condição de estabilidade.
É através deste objeto vítreo – a garrafa, que o bêbado Rimbaud olha e traduz o mundo através de uma poesia que indaga a realidade paradoxal:
“Porque eu vi demais... Porque eu soube demais... porque eu tive demais. Oh sons e visões. Partida entre afetos e ruídos novos...”
Existe, ainda, um resto do líquido a balançar quando o olhar do ator atravessa aquela garrafa? Sobre que mar rubro sua visão é apoiada? Rimbaud foi, mesmo, um rebelde irreverente irresponsável, ou seu olhar sobre a realidade atravessava outra lente desconhecida pela maioria que tratou de excluí-lo sob o título de marginal?
HILDA NASCIMENTO - PREPARADORA DE ELENCO E DIRETORA ASSISTENTE
Adorei, conte-me mais!
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